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quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Acompanhar por amar

Sei que o título é ruim, mas vale a pena ler o que escrevi com tanto carinho pra vocês... Julio deu espaço e me deixou desabafar um pouquinho com vocês.

Acompanhar nas consultas, nas pulsoterapias, nos locais de exames, nas filas pra marcar o exame, empurrando cadeira de rodas, segurando a mão pra não cair, socorrendo em momentos de surto, aplicando as injeções ou lembrando o horário do remédio, tudo isso faz parte da minha rotina de acompanhante. Mas o que é um acompanhante?

Nunca parei pra pensar o que era um acompanhante e qual o seu papel até o dia em que comecei a namorar com Julio. Até aquele dia só ouvia falar em acompanhante, mas não sabia ser. Foi então que tive que descobrir na prática o que era ser acompanhante, acompanhante é a pessoa que é paciente. Na época as pessoas me olhavam diferente, às vezes chegavam até a dizer que "eu sou uma menina muito nova pra ficar andando em hospital”, “que isso de cuidar do Julio não é pra mim, porque eu não sou culpada por ele estar doente”, “quem tem que acompanhar ele é a mãe dele, tu não é obrigada a ficar andando pra cima e pra baixo com ele” e, pasmem, ouvia todos esses "conselhos" no hospital. 
Mas, peraí existe alguém que seja culpado por outra ter Esclerose Múltipla? Será que é só isso? Acompanhante é só alguém velho que cuida porque o doente é da família? Será? Acho que agora preciso contar nossa história pra vocês: 

Em 2012 eu me achava muito feia, então, postei uma foto no facebook só pra ver se alguém me achava bonita. Postei a foto num grupo e vários comentários surgiram, dentre eles havia um rapaz que estudava e dava aula de tecido acrobático na Universidade Federal do Amazonas, esse cara não era o Julio. Mesmo morrendo de medo, marquei um encontro com ele e fui na data marcada. Mas não no horário marcado, cheguei com algumas horas de antecedência. Fiquei conversando com pessoas aleatórias pela universidade. Sentada na parada de ônibus conversando com um casal, fui ajeitar meu cabelo e ao virar o rosto vi um rapaz moreno, bonito, magro, alto caminhar na direção da parada de ônibus. Fiquei encantada por ver um homem tão bonito, decidi que precisava falar com ele. Levantei em um salto e ele passou por mim direto, dei passos rápidos pra alcançá-lo e, então, puxei o braço dele (TÔ NEM AÍ, PUXEI MESMO). Iniciei uma conversa muito boba, mas no fim consegui adicionar ele no facebook e ainda consegui o número dos dois telefones dele. Então, naquele dia 3 de setembro de 2012 eu me apaixonei à primeira vista, pela primeira vez. Infelizmente, Julio namorava na época e eu também.

Conversamos durante muito tempo até que ele finalmente começou a dar sinais de que tinha interesses a mais. Em junho de 2013 nos beijamos pela primeira vez e foi mágico, fiquei dias rindo sozinha e relembrando aquele momento. Em setembro-outubro do mesmo ano (2013) mandei mensagem pra ele, mas ele não lembrava mais de mim. Chorei por muito tempo e desisti de ficar com ele. Em janeiro de 2014 por problemas familiares eu precisaria me casar às pressas com um namorado que tive em 2012, época que conheci Julio. Estava tudo pronto pro meu casamento, seria coisa simples. Até que Júlio me manda mensagem e depois de longas horas de conversa ele me pede em namoro, Julio estava solteiro desde 2013 e eu não tinha me contado. Na hora eu neguei porque eu estava noiva e me casaria em pouquíssimo tempo. Parei e pensei em tudo que imaginei viver com o Julio, eu jogaria tudo fora por um casamento que eu nem queria? Óbvio que não, então, aceitei o pedido do Julio.

Aceitei namorá-lo no dia 24 de fevereiro de 2014, mas só encontrei com ele 2 dias depois. Achava que a HIStória de ele ter Esclerose Múltipla, na verdade, era EStória, até que o vi recebendo a medicação pela primeira vez. Achei que era encenação. Até que ele me chamou pra acompanhá-lo pra uma tal de pulsoterapia, nunca havia ouvido falar naquilo em toda a minha curta vida. Na época, tudo o que eu sabia sobre a Esclerose Múltipla era que “quando queremos pegar uma caneta enviamos a informação pro nosso cérebro através de impulsos elétricos, esses impulsos são enviados através do axônio e os mesmos impulsos elétricos só se mantém nele e realizam as sinapses por causa de um negócio chamado mielina, quando essa mielina está danificada, as informações não tem tanta qualidade, então, ou você demora a pegar a caneta ou você não vai pegá-la. Na esclerose múltipla é isso que acontece, os neurônios agem em tempos diferentes”. Comecei a perceber que Julio não estava mentindo e quando eu finalmente me convenci disso, decidi que passaria o que fosse necessário pra acompanhá-lo sempre nos tratamentos.

Eu era uma garota de 17 anos que esperava ansiosamente que os 5 meses que viriam passassem bem rápido pra eu completar meus tão sonhados 18 anos. Por que eu queria isso? Porque as pessoas agiam como se eu não soubesse nada a respeito da doença, ignoravam informações que eu dava ou qualquer ajuda que eu oferecesse. "Porque só adultos sabem das coisas". Mês passado foi para o 2º Encontro de Pacientes e Blogueiros de Esclerose Múltipla, lá ouvi pela primeira vez a expressão "Paciente 2.0" que é aquele paciente que pesquisa e participar na decisão do tratamento. Me surgiu lá a expressão "Acompanhante 2.0" que é a mesma coisa, mas a pesquisa e a participação são de ângulos diferentes do de um portador. Duas coisas engraçadas que aconteceram e vale a pena contar aqui: 

1) Julio não estava respondendo bem ao Interferon Beta 1-b, mandamos mensagem pra médica e ela informou que mudaria o medicamento. Não falou pra qual mudaria. Como desde junho do ano anterior (2014) acompanho o blog Esclerose Múltipla e Eu, sempre lia os comentários e, por isso, estava cheia de informações. Via sempre pessoas comentando remédios e comecei a pesquisar as bulas dos remédios comentados e ver as possibilidades do Julio um dia administrá-los. Quando a médica falou que mudaria eu disse logo "vai ser o Copaxone". O problema disso é que o Copaxone é injetável diariamente e alguns familiares do Ju tinham recebido a informação que o "remédio oral" já estava disponível pelo SUS, e por que pensar que vai ser injetável se o remédio oral é bem mais prático, né?! Mas eu sabia que o "remédio oral" não era pra qualquer um e não conseguiríamos tão fácil assim. Ao discordar e falar que o próximo, provavelmente, seria o Copaxone ouvi um coral de "CALA A BOCA QUE TU NÃO É MÉDICA", desse jeito e com essas palavras que ecoam até agora na minha cabeça. Me calei e fiquei com os olhos marejados. Na segunda-feira fomos até o consultório e a notícia veio: Julio passaria a administrar o Copaxone. Eu ri e pensei "quem é mesmo que sabe mais? Posso não ser médica, mas pelo menos eu pesquiso antes de sair mandando os outros calarem a boca, e olha que eu NUNCA mando pessoas calarem a boca". Quer saber como eu me senti? Exatamente assim:


2) Julio foi parar em uma clínica naturalista. Mais uma vez o desrespeito ao acompanhante jovem reinava. A mulher nos tratava como completos ignorantes, principalmente a mim. Pra quem não sabe, eu não sou graduada, e inclusive ela sempre jogava isso na minha cara, mas adoro pesquisar sobre TUDO, principalmente o desconhecido. Sempre gostei muito de conhecer coisas novas e acho que minha vida é feita disso, buscar coisas novas. Chegamos na clínica e a dona de lá "sabia de tudo", mas as terapias não faziam sentido nenhum e Julio sempre me questionava pra quê funcionavam as terapias. Tínhamos muitos "por ques" e poucos "porques", como eu costumo dizer. No terceiro dia decidimos perguntar o que era Esclerose Múltipla na visão de um naturalista, isso porque tínhamos lido que cada tratamento alternativo tinha uma visão sobre a doença e queríamos saber a visão dela. Sabem qual foi a resposta dela? Que "essa menina só quer palco". Saí furiosa, como ela recebe pra tratar uma doença que ela nem sabe o que é? Acreditem, ela espalhou pra meio mundo que a bruxa nessa história sou eu, mas pra minha felicidade Julio gravou toda a situação e ouvindo dá pra notar como a mulher me tratava com arrogância me humilhando o máximo que desse. 

Já passei por poucas e boas pelo Julio. Será que eu aos meus olhos acompanhar é uma obrigação? Ninguém pergunta “Você ama esse rapaz?”, todo mundo acha mais fácil perguntar “Você é irmã dele? Você é da família?”. As pessoas se admiram quando digo minha idade, felizmente agora já tenho 19 anos, mas por que essa admiração? Acho que deveriam ensinar as pessoas a serem um pouco mais amáveis e menos julgadoras. Lembro da minha mãe dizendo que quando tinha 14 anos sempre ia em asilos cuidar de velhinhos por puro prazer.

Acho que se as pessoas entendessem de uma vez por todas que acompanhar é mais ato de amor, do que de cumprir uma obrigação, elas entenderiam porque eu faço questão de ficar com o Julio passando pelo que quer que seja. Se é pra empurrar cadeira de rodas, faço isso e ainda ajudo ele a fazer piadas, porque juntos nós passaremos por isso. Se for uma incontinência, qualquer que seja, ajudo ele e ainda ajudo a fazer piada, porque nós podemos juntos tentar buscar uma forma pra diminuir os acidentes desagradáveis, afinal quando um Acompanhante 2.0 se une ao Paciente 2.0 e tocam o barco dá nisso, diversão sempre. É por isso que eu e Julio não nos largamos nunca, é porque #JuntosSomosMaisFortes.

3 comentários:

  1. Que demais Paulinha. Escreva mais menina!! O Ju tem muita sorte de ter você. Lindos. Beijos

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  2. Orgulho da minha mana <3 , na vdd também não sabia nada da doença, agora sei + ou - , rs

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  3. Orgulho da minha mana <3 , na vdd também não sabia nada da doença, agora sei + ou - , rs

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